Do momento originário ao poema: o estado da razão (Parte II)
Uma das características essenciais da não lógica Zen é a simetria. A razão disso é intuitiva, na medida em que a simetria representa sempre um módulo de ordem, o efeito de um cálculo. Para Fiama, o efeito desse cálculo é o poema que a obriga a ordenar os momentos indizíveis. Para se despossuir do estado de tormento seria basilar afastar-se da consciência da Poesia que tende a racionalizar os momentos idílicos de fusão com a Natureza. Os poemas que constituem a Área Branca não são nem meramente, nem principalmente representativos, porque a poesia não é apenas encarada como uma representação da natureza, como atrás falávamos, mas assumindo, ela própria, um trabalho da natureza. Fiama não vê rígidas divisões entre espírito e natureza, sujeito e objecto, bem e mal, artista e meio.
O poema é uma espécie de sonho da razão que produz a experiência diurna de forma alterada, ou seja, reinventada e transposta num plano em que a conivência com o momento originário seja uma conversão e não uma tradução; uma ficção e não uma reprodução. Então o verbo atormentar – de uso comum na poesia de Fiama – surge porque não existe uma identificação do sujeito com a realidade que apela à consciência e à racionalização dos actos. Por isso, a poesia a atormenta, obrigando-a a racionalizar os sons. Queremos com isto dizer que Fiama apenas consegue nomear os objectos que, por sua vez, estão representados por sinais. Logo, só poderá falar deles e nunca exprimi-los, pois um poema só pode dizer como uma coisa é, não o que ela é.
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